sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

O leilão da Brasília


Era apenas mais um domingo. Como não sou muito ligado em futebol, decidi sair para encontrar velhos amigos. Deixei o Gol na garagem e chamei um carro via aplicativo. Assim que cheguei ao bairro no qual cresci, fui reencontrado os velhos amigos e fomos até a oficina do Rodrigo, ponto de encontro do pessoal nos finais de semana, cerveja gelada e sempre com um bom churrasco improvisado, coisas de vila.

Não pude deixar de observar em um canto meio esquecido uma Brasília, o carro bem judiado e com sinais de início de reforma. Observando mais atentamente, lembrei que aquela Brasília era o carro de transporte do açougue da dona Dilma, sócia do senhor Michel. Perguntei para Rodrigo o que o carro fazia parado ali. O mecânico sem mais cerimônias contou sobre o causo. Dona Dilma estava maquiando as contas do açougue, os funcionários avisaram seu Michel que logo deu um jeito de desfazer a sociedade. Ficou a Brasília como espólio e Michel deu início à reforma.
Puxando pela memória fui lembrando de como a Brasília era quando pertencia ao seu Luiz: ela realmente parecia mais lustrosa, me distraí lembrando os velhos tempos, até que o Neves, sujeito sem escrúpulos, continuou a contar a história da Brasília. Dona Dilma, quando soube que perderia a posse do carro, deixou a manutenção de lado, entregou toda detonada para seu Michel – contava rindo .O velho senhor quase perde o açougue com um escândalo nas carnes, deu até polícia, mas se livrou das acusações e começou as reformas.

Olhando para a Brasília, já um pouco alegre por causa das cervejas e farto de tanto comer, comecei a prestar atenção nos remendos, pareciam bons de longe, mas ao me aproximar eram bem ruins. Rodrigo, afilhado de Michel, logo começou a defender o padrinho, dizendo que no tempo que ficou com o carro o patrono fez muitas melhorias nele, colocou pneus novos e fez outras pequenas melhorias mecânicas e estéticas. Papo furado! Não me convenci sobre tais melhoras apesar de realmente existirem peças em bom estado.

As horas foram passando e a Brasília ficou ali esquecida, até que o clima de leilão tomou conta da pequena oficina. Seu Michel foi o primeiro a chegar, Fernando e Jair não demoraram muito, vieram pela rua já batendo boca, disputando para saber quem compraria o veículo e terminaria aquela reforma inacabada. Fernando é um sujeito um tanto moderno, propôs uma transformação na Brasília, mas o sobrinho de Dona Dilma não passou credibilidade ao dar seu lance. Jair, um militar reformado e caricato, prometeu investir na Brasília buscando uma restauração mais tradicional, algo acordado por Michel que sinalizou aceitar a venda.

Olhei para meu copo ainda cheio, pensei em tudo que havia presenciado e tive uma única certeza: o relógio dizia que era hora de voltar para casa. Em um gole acabei com aquela cerveja já morna, levantei um pouco desiquilibrado, talvez até atordoado com tanta conversa, pedi mais uma vez um carro e ao chegar em casa já dei a ressaca por certa. Afinal, é sempre complicado falar sobre Brasília, seja aquela antiga da Volkswagen ou a cidade planejada de Oscar Niemayer e Lúcio Costa, ambas são barulhentas, uma com motor dentro do carro a outra com suas discussões internas que sufocam os sonhos de 

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